Tem quem diga que a vida não é um jogo. E realmente não é. Mas quando se trata de cooperativismo e de soluções inovadoras para o mercado, sempre há caminhos para que todos ganhem essa partida. É por isso que as cooperativas de jogos estão surgindo e ganhando relevância no mercado de desenvolvimento games.
Quando nos deparamos com um jogo que conta com centenas de horas de conteúdo emocionante e cheio de adrenalina, não temos ideia de tudo que aconteceu até que ele fosse liberado para o público. A verdade é que, muitas vezes, a realidade é mais complicada do que parece.
É comum encontrar denúncias gravíssimas de condições precárias de trabalho no mercado de games. Empresas de grande porte como a Epic Games (dona da Steam), a Rockstar Games (desenvolvedora da série GTA, dentre outras) e até a Electronic Arts (que produz a popular série Fifa, por exemplo) já foram alvos de relatos de profissionais que passaram longos períodos de burnout e desgaste físico e mental.
Isso explica por que cooperativas de jogos estão ganhando espaço nesse meio. Além de proporcionar condições mais adequadas de trabalho, elas também criam rotinas profissionais mais humanizadas e criativas. Todo mundo ganha: tanto os desenvolvedores quanto os consumidores!
Cooperativas de jogos já são realidade – veja exemplos!
O desenvolvimento de jogos é um mercado multibilionário. E, mesmo assim, muitos dos profissionais altamente qualificados, que possuem as capacidades técnicas e criativas para que esses produtos saiam do papel, seguem recebendo poucos frutos desse esforço.
Mas não precisa ser sempre assim. As cooperativas de jogos que vamos conhecer a seguir provam que é possível unir o útil ao agradável e pontuar nesse mercado que, apesar de divertido, não é brincadeira.
Motion Twin: um sucesso estrondoso na cena independente
Fundado em 2001 na França, o estúdio Motion Twin é a prova de que é possível ter uma altíssima produtividade e, ainda assim, seguir os conceitos do cooperativismo. Até o momento, o estúdio desenvolveu mais de 150 jogos, sendo o principal deles a obra Dead Cells, com mais de 5 milhões de unidades vendidas.
Dead Cells é um de ação roguelike em 2D (jogo em que as fases se desenvolvem de forma procedural – isto é, uma jogatina nunca será igual à outra). Na Steam, o game conta com mais de 110 mil avaliações classificadas como extremamente positivas. No agregador de reviews Metacritic ele chega à nota 91/100.
Outro ponto que chama atenção em relação à Motion Twin é a variedade do catálogo: com apenas sete funcionários registrados em seu site, a cooperativa consegue entregar uma ampla gama de estilos de jogos que se posicionam como referências do gênero indie.
The Glory Society defende mais cooperativas de jogos na indústria
The Glory Society é o exemplo de como o trabalho criativo, quando unido ao sistema de cooperativismo, pode gerar obras realmente marcantes. A marca foi criada pelos desenvolvedores do clássico indie Night in the Woods (2017). O estúdio estampa orgulhosamente em seu site a ideia de que “chefes não são necessários”.
Wren Farren, um dos fundadores da coop, disse em entrevista que “incorporar sindicatos e cooperativas na indústria permite que os desenvolvedores sejam mais saudáveis e felizes”. Ele ainda acrescentou: “decidimos fundar a cooperativa de trabalho porque estávamos cansados de nos sentirmos presos nessa relação chefe/funcionário”.
Depois de conhecer essa história, fica a pergunta: o que aconteceria se essa tendência ganhasse forma no mercado? E se as grandes mentes por trás de jogos renomados decidissem que é hora de respeitar suas próprias ideias e formatos de trabalho?
No Future Club, as cooperativas de jogos são o futuro – e o presente
Mais um caso de desenvolvedores que se uniram no formato de cooperativa de jogos, a Future Club foi fundada em 2020 e foca no estilo tradicional de animação 2D. O diferencial nesse caso é como esses profissionais conseguiram driblar uma das maiores dificuldades de sair de uma empresa multinacional: a falta de recursos.
Enquanto companhias investem milhões de dólares em tecnologias realistas, a Future Club mostra que o cuidado artístico ainda pode ser um grande diferencial das cooperativas de jogos. Além de desviar da falta de equipamentos e mão de obra, isso também reforça o talento de criadores que possuem um estilo próprio.
A transformação da KO_OP em uma coop
O que acontece quando uma empresa decide mudar seus rumos para se tornar uma cooperativa de jogos? Essa é exatamente a jornada pela qual a KO_OP está passando. Apesar do nome sugestivo, o estúdio não nasceu como uma cooperativa de jogos.
Fundada em Montreal, no Canadá, a companhia optou por uma transformação em seu sistema de gestão, aderindo ao formato de cooperativa. Esse processo está sendo compartilhado e dividido com público por meio de entrevistas e reportagens.
O primeiro jogo da KO_OP já está em produção e tem seu lançamento previsto para junho. Goodbye Volcano High reforça a ideia de que games se tornaram mídias para narrativas de nível cinematográfico, mostrando uma história de amor interativa.
Soft Not Weak: colaboração cooperativa em prática
Assim como muitas cooperativas, a Soft Not Weak nasceu da parceria de três colegas de quarto que queriam reunir boas ideias para revolucionar um mercado ultrapassado e com condições inadequadas.
Talento por talento, a companhia se reforçou com mentes que compartilhavam desse ideal. Para que o primeiro jogo deles fosse lançado, portanto, a cooperativa escolheu um caminho colaborativo: o crowdfunding.
O primeiro jogo da cooperativa, Spirit Swap, mostrará uma fantasia com pautas modernas e inclusivas. Dessa forma, o estúdio ainda mostra o papel social do cooperativismo atrelado aos seus princípios.
Talespinners e a maestria narrativa
Em termos de storytelling, a Talespinners é uma grande referência. Desenvolvida por escritores freelancers de jogos, a cooperativa conta com narrativas excepcionais. Assim, ela foi responsável por obras como a história que conduz o jogo Disco Elysium, que marcou história e se tornou sinônimo de qualidade em narrativa para games.
Fundada na Inglaterra, ela engloba diversas etapas do desenvolvimento como a criação de diálogos, textos, direção e até mesmo consultorias para que os produtos sejam distribuídos com o máximo de qualidade para o público.
Cooperativas de jogos: por que escolher o modelo de negócios cooperativista?
Para algumas pessoas, jogos são sinônimos de perder ou ganhar. Mas não é de hoje em que os jogos cooperativos, em que todos colaboram em busca do resultado, vieram para ficar.
A mesma coisa acontece com o sistema de cooperativismo. Além de contar com a participação igualitária de todos os membros envolvidos, quebrando paradigmas hierárquicos que não cabem mais aos tempos contemporâneos, essa metodologia também beneficia toda a comunidade.
Ao desenvolver um jogo com foco em contribuição artística ao invés de visar somente o lucro específico de uma parcela muito pequena de empresários, tanto os criadores quanto os jogadores saem como vencedores. Isso reforça, também, o senso de pertencimento. O cooperativismo garante que a arte continue a ser de quem permitiu que ela ganhasse vida.
Pautas mais importantes são incluídas, formatos artísticos variados são reconhecidos, profissionais recebem condições muito melhores de trabalho. Isso tudo com o pensamento no impacto social, sustentável e econômico que essa proposta pode ter para o mundo.
Conclusão: o cooperativismo é tech, o cooperativismo é pop
O cooperativismo já tem mais de 200 anos. Mas uma das características mais fortes desse sistema é a capacidade dele de se moldar ao que os tempos modernos exigem. Da produção de alimentos até as cooperativas de jogos, muita coisa mudou. No entanto, o senso de colaboração permanece o mesmo.
A nova economia exige um pensamento mais dinâmico, igualitário e resiliente. Coincidentemente – ou não – todas essas habilidades estão na base do cooperativismo. Não é à toa que, em um mercado reconhecido pelas condições críticas de trabalho, esse movimento está ganhando tanta força.
Os profissionais da área já perceberam que o futuro dos jogos pode ser mais humano. Está claro que, enquanto as multinacionais focam nas tecnologias, o segmento indie ganha uma força por meio da valorização de talentos e da entrega de conteúdos originais.
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